Seria simples poder
somente pensar, almejar as singelas harmonias presentes no ar. Sem um quê de
preocupação com o ontem, o agora ou o amanhã. Foi com estes pensamentos que
Eliot saiu de casa em uma manhã quente com um céu carregado de nuvens que
prometiam uma tempestade. Ao tomar o coletivo que o deixaria em seu labor
diário pensou em como poderia realmente ser simples, mas não era. Lembrou-se da
noite anterior, não dormiu bem, na verdade já não dormia bem a alguns anos, mas
isso não era problema pois também se configurava simples, mormente comum dentro
de uma vida acelerada e um pensamento que a acompanhava em lampejos. O divagar
consigo era uma espécie de autorreflexão, talvez um tipo comum de narcisismo
exacerbado, este que todos temos ao ver nosso reflexo no espelho, na alma.
Pediu licença e sentou-se
no fundo do ônibus. Observar os rostos todas as manhas era um passatempo
metódico mas não deixava de ser interessante, o que mais parecia ser provável
não o era, as mesmas pessoas, os mesmos horários, mas as feições eram
diferentes, captar as emoções presentes nessas feições sempre levou Eliot a
galgar novos mundos em um curto espaço de tempo, o mais comum poderia não ser
realmente tão fugaz. Havia uma moça, por exemplo, que tinha uma expressão para
cada manhã, os dias pesavam de forma abstratas; nas segundas-feiras ela estava
com um sorriso estampado, com o decorrer dos dias este sorriso ia se esvaindo,
e as sextas ele já não existia. O curioso era que este efeito era contrário na
maioria das pessoas, não era estranho, era diferente. Eliot se encantava por
tudo que lhe fosse alternativo, fora do comum, o que não era padronizado dentro
de uma normalidade cabal. Um simples sorriso que exprimisse a singeleza e a
sinceridade que permeia as almas dos inocentes.
Incomum, talvez a palavra
certa seja essa, Eliot sabia muito bem a carga semântica que este termo
soava. Era uma pessoa dentro dos
padrões, estes estabelecidos como normais por uma sociedade que apresenta em
seu decurso um comportamento de massa. Diferente era a alcunha que recebia
quando em poucos momentos expressava sua opinião, seja ela no trabalho, em
casa, na vida. Chamavam-no de “o estranho”. Ele nunca se incomodou muito com o
apelido, mas suas opiniões foram ficando cada vez mais escassas, rareando, sumindo.
Com o tempo limitou-se apenas aos
cumprimentos formais usuais, como manda uma boa educação tradicional. No mais,
se afundava em sua cadeira giratória e fazia seu serviço de forma automática e
repetitiva, mas com avidez, não gostava de ser cobrado, não pelo simples ato da
cobrança em si, mas pelo fato de não querer travar um diálogo com outrem. Suas
respostas se resumiam basicamente em sim e não e bastava isso umas quatro ou
cinco vezes por dia. A ideia de se comunicar de mais o apavorava
circunstancialmente, silêncios que permeiam uma total falta de
comunicabilidade. Mas a situação nem sempre foi essa, o diálogo já foi algo
praticado assiduamente por Eliot, antes, no início do final, mas sem delongas
caro leitor, vamos agora ao ponto inicial, as nuvens carregadas de uma manhã de
março....
Eclésio Giovanni - Eliot –
Da Consternação do Pensar, Parte I
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